A primeira coisa que tenho pra falar (e aliás foi o que me fez querer voltar) é sobre a manifestação contra o aumento da passagem do ônibus. Não propriamente sobre a manifestação, mas sobre uma reportagem que eu li na Veja e na Veja São Paulo essa semana (ontem). Eu na verdade sei muito pouco sobre o assunto, e não me atrevo a falar sobre ele pois qualquer coisa que eu dissesse seria apenas uma repetição do que me contaram, considerando que eu não estava lá. Mas eu sei como tudo NÃO FOI, e é exatamente assim que a Veja conta.
A maior preocupação da reportagem era mostrar como o movimento era pequeno, formado por um grupo de 40 pessoas que nem sede em São Paulo tinha. E que as outras pessoas que se uniram ao movimento eram apenas desocupados que queriam se sentir rebeldes (incluindo, segundo eles, líderes de grupos punks que já foram acusados de vandalismo diversas vezes antes). Para isso, utilizam a pior estratégia possível: traçar um perfil dos manifestantes. Um perfil altamente subjetivo, afinal eles certamente escolhem um grupo de manifestantes para representar o todo, quando na verdade este todo é heterogêneo demais para ser representado. Esse grupo é caracterizado por suas altas rendas familiares e por ser adventos de colégios caros de São Paulo, criando uma imagem errônea de que são filhinhos de papai que não têm porquê se manifestar, afinal nem usam transporte público. A verdade é que os leitores da revista não param para pensar: no que a condição econômica afeta os manifestantes? Eles são ricos e ainda assim estão ali manifestando. Sua condição econômica não os impede de ter consciência política. Suas ideias não são menos importantes apenas por ter tido a sorte de nascer numa família rica. Ter dinheiro para suprir o que o Estado não atende não faz com que o problema deixe de existir a seus olhos.
O mais absurdo foi compará-los ao adolescente da canção Rebelde Sem Causa, do Ultraje a Rigor, aquele que os pais "tratam muito bem" e "dão dinheiro pra gastar com a mulherada". O jovem, na música, está revoltado pois seus pais não lhe dão motivos para se rebelar e ele precisa disso para crescer. Mas sério? Será que a maioria está lá simplesmente porque quer ser rebelde e não tem o que fazer em casa? Se sujeitando a bombas de gás lacrimogênio e balas de borracha só pra matar o tédio e o desejo de ser visto? Eu, pessoalmente, não faria isso sem um motivo bem forte.
Outro ponto que eu achei absurdo foi a reportagem retratar os manifestantes como vândalos, mostrando números sobre os carros depredados e todos os "prejuízos" que nossa querida presidenta Dilma terá que cobrir. Juro, desculpem a referência, mas me senti como um morador da Capital dentro de Jogos Vorazes, convencidos pela mídia de que confinar seus jovens para matar uns aos outros é um ato justificável. A reportagem trazia depoimentos de pessoas que se sentiram prejudicadas pelo bloqueio no trânsito. Fiquei inconformada com isso. Como alguém em sã consciência pode suportar qualquer afirmação que aquela revista faça e ainda por cima dar depoimentos a favor dela? E mais ainda, um jornalista, que passa por vários anos de faculdade, anos vendo o que está de fato acontecendo no país, e submete todo seu trabalho tão facilmente a um jogo político como esse?
Ao longo da matéria, exemplificavam seu ponto de vista com tweets de manifestantes dizendo que "não é por 0,20 e sim pelo direito de protestar". Sim, sabemos que isso é verdade, mas colocado daquela forma, e usado como argumento por uma revista com ponto de vista oposto à manifestação, os tweets fazem parecer que o protesto não tinha, de fato, um motivo. Aliás, justificar uma matéria supostamente séria com tweets não me parece muito correto.
O último ponto absurdo de tudo isso é o final de uma das reportagens, não lembro se era da Veja ou da Veja São Paulo (misturei tanto as duas matérias neste post, me desculpem, eu não lembro qual é qual), mostrando o depoimento de 4 pessoas a favor do movimento, transcrevendo exatamente o que disseram (e certamente cortando algumas partes importantes, além de dá-los a devida caracterização de riquinhos filhos de papai), sob o título "Aqueles que acreditam na irrealidade do transporte gratuito". Irrealidade. Essa foi a palavra utilizada. Consigo até ver a ideia que eles querem passar se formando na cabeça dos leitores. Poucas pessoas lutando por uma coisa que nunca acontecerá. Puff, que idiotas.
Finalizo meu texto com uma frase que vi no facebook há um tempo atrás (sim, às vezes saem algumas boas ideias de lá): "Veja - se ver, não compre; se comprar, não leia; se ler, não acredite".
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